quarta-feira, abril 23, 2008

A táctica do placebo sacrificial

O meu avô materno era um bom garfo (a quem devo metade da minha herança genética na matéria).
Tinha especial apetência por mariscos, mas atirava-se com igual destreza a pratos de peixe ou carne e deleitava-se demoradamente pelas sobremesas. Tudo isto bem regado, é claro!
Na fase mais avançada da sua vida começou a ter problemas digestivos. Passava mal após as refeições. Foi mais ou menos por essa altura que ganhou o hábito inamovível de comer uma canjinha após os repastos mais avantajados.
Depois de o vermos atirar-se com galhardia a umas tantas navalheiras, um monte de camarões, uns "carros" de sapateira, enfrentava com igual vigor e ligeireza umas pratadas de caldeirada e banqueteava-se em repetição pelos doces. Era sempre com algum espanto que o víamos no fim avançar metódico para a sua canjinha.
No dia seguinte estava invariavelmente indisposto, quebrado.
Era então que, em tom de certeza conformada, nos confidenciava:
- Não foi senão aquela canjinha de ontem que me caiu mal.